O impacto de transtornos emocionais representam uma das maiores dificuldades do mundo contemporâneo. O surgimento da Pandemia do Covid-19 aumentou exponencialmente os casos de doenças psíquicas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão será a doença mais comum até 2030. No Brasil, 18,6 milhões de pessoas sofrem de algum grau de ansiedade. Estes dados mostram como as doenças de origem emocional merecem atenção especial e precisam ser tratadas com seriedade.
Não é difícil encontrar uma infinidade de informações sobre doenças emocionais, demonstrando as alterações que ocorrem no comportamento e sugerindo novos hábitos de vida. Isso é realmente muito importante, você precisa se entender buscar formas de melhorar a sua qualidade de vida. Entretanto, hoje convido você a conhecer uma abordagem diferente, o papo hoje será uma visão orgânica das desordens emocionais. Confira!
Tudo começa com o Estresse – O Início dos Transtornos Emocionais
Diferente do que imaginávamos, o estresse é uma função biológica fundamental para a manutenção da vida. Este mecanismo é chamado de luta e fuga, e é uma “ferramenta” biológica controlada pelo Sistema Nervoso Autônomo (SNA), que é responsável por desempenhar todas as funções orgânicas do nosso corpo, por exemplo, você não precisa se lembrar de respirar, piscar os olhos ou contrair e relaxar o músculo do seu coração, pois isso acontece de involuntariamente. Dessa forma, frente a situações que nos trazem perigo (real ou imaginário), ficamos automaticamente estressados.
Basicamente, funciona da seguinte maneira: para que o seu corpo seja capaz de encarar a situação (luta) ou se esquivar dela (fuga) é necessário que algumas funções do organismo sejam adaptadas. As principais adaptações envolvem o aumento da pressão arterial, frequência cardíaca, glicose sanguínea e aumento da secreção de cortisol.
O estresse é classificado em três níveis:
- Positivo: Resposta de curta duração, causa pequenos aumentos no batimento cardíaco e nas concentrações hormonais relacionadas ao estresse;
- Tolerável: Reações severas, que prejudicam a arquitetura cerebral, podem ser minimizadas por mecanismos protetores, desde que as reações ocorram em curto período de tempo;
- Tóxico: Reações severas e prolongadas, causa danos na arquitetura cerebral e leva a problemas permanentes de aprendizagem, comportamento, saúde física e mental.
Onde entra o Cortisol nessa relação?
O cortisol é um indicador de estresse crônico. Trata-se de um glicocorticóide envolvido na manutenção da homeostasia corporal. Sua secreção se inicia a partir de sinais sensoriais produzidos pelo hipotálamo, que induzem a liberação do Hormônio Adrenocorticotrófico (ACTH) pela hipófise, e irá estimular as glândulas suprarrenais a secretar hormônios adrenocorticais, como o cortisol. As funções do cortisol acontecem durante períodos de jejum, induzindo a utilização das reservas energéticas do organismo, tem efeito antiinflamatório (modula a resposta imunológica) e promove a manutenção da pressão sanguínea.
Quando uma situação de estresse acontece, a secreção de cortisol é aumentada induzindo respostas fisiológicas e alterações no sentido de adaptação do corpo à situação vivenciada. Assim que o desafio é superado, as funções são restabelecidas e os níveis de cortisol retornam ao normal. Em algumas situações, o cortisol continua aumentando em nosso organismo.
É possível mensurar a dosagem do Cortisol através de exames
A dosagem do cortisol é muito importante, pois suas alterações podem levar ao desenvolvimento de doenças metabólicas e psicológicas. Essa dosagem é feita através do sangue, urina e saliva. Os principais exames que mensuram os níveis de cortisol no nosso corpo são:
- Dosagem de Cortisol Basal
- Dosagem de Cortisol Salivar
- Dosagem de Cortisol em Urina 24h
- Dosagem do Hormônio Adrenocorticortrófico – ACTH
Para se realizar a dosagem do cortisol e ACTH, não é necessário jejum (exceto em coleta salivar que é necessário seguir algumas especificações). Algo que é muito importante em relação a estes exames é o horário de coleta e o emprego de repouso de 30 minutos antes da coleta (exceto em dosagem urinária).
Em dosagens sanguíneas, a coleta deve ser realizada entre as 7 ás 9 horas da manhã, não devendo ser realizada a dosagem em amostras coletadas após ás 10 horas (salvo á pedido médico). O horário preferencial desta coleta é as 8 horas da manhã.
Na coleta salivar, recomenda-se que mantenha jejum nos 30 minutos antecedentes da coleta, e os horários em que essa coleta é realizada são ás 08, 11, 16 e 23 horas, sendo definido pelo médico o horário e a quantidade de coletas necessária.
A dosagem na urina é através de amostra de urina de 24 horas, ou seja, você irá coletar toda a urina que fizer no período de 24 horas em um coletor específico, e leva-la para análise laboratorial. Este teste é mais sensível e específico, pois representa melhor a função glandular que as dosagens em horários específicos.
O que pode significar o cortisol alto?
Diversos estudos mostram a relação entre o cortisol alto e o consequente desenvolvimento de desordens metabólicas em adultos e crianças. Por exemplo, hoje sabe-se que pessoas com sobrepeso possuem uma elevação nos níveis de cortisol em relação a pessoas com peso adequado. Isso acontece porque com o aumento crônico do cortisol (causado principalmente por excesso de situações estressantes no cotidiano), nosso organismo cria estratégias de compensação para diminuir esse estímulo estressor. A estratégia mais fácil e rápida para diminuir esse estímulo é através da alimentação, principalmente de alimentos hipercalórico, rico em gordura e carboidrato.
Resultado: aumento de peso, aumento do colesterol e aumento da glicose sanguínea. Além disso, o cortisol promove resistência à insulina (a insulina é responsável por diminuir os níveis de glicose no sangue).
No campo psíquico, o aumento do cortisol está associado á disfunções do sono, provocando insônia. A privação de sono, por sua vez causa uma cascata de alterações biológicas, que vão desde o aumento da pressão arterial, até a diminuição da capacidade cognitiva. Os distúrbios alimentares também estão associados ao aumento do cortisol, devido à elevação da predisposição as compulsões alimentares.
Em situações ainda mais graves, há evidências de que disfunções no cortisol e ACTH estão presentes em sujeitos que tentaram suicídio, tanto em adultos jovens e idosos acima de 65 anos.
A atenção à saúde é fundamental em todos os momentos da vida. O que precisamos entender é que algumas alterações comportamentais, estéticas e até metabólicas podem ter raízes biológicas bem específicas e são muito comuns. É muito importante que seja investigada a causa do problema, e não apenas tratado o sintoma que ele provoca. Este é um importante fator para podermos desfrutar de uma vida plena, saudável e feliz.
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Referências
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